terça-feira, 27 de maio de 2008

José Vidal-Beneyto: O Socialismo Liberal / 3


Umha das poucas vozes de esquerdas que aínda se podem atopar em El País é a de José Vidal-Beneyto. Veja-se senom a sua defensa do Che Guevara tras o noxento editorial do citado diário. O que segue é o último até agora dos seus artigos sobre "o socialismo liberal" como o entende el.

O pensador e analista social Jürgen Habermas, considerado a figura mais relevante da segunda fornada da Escola Crítica, nom pode ser qualificado de membro de pleno direito do grupo promotor do socialismo liberal, mais a sua obsessom pola urgência em refundar a democracia e a sua insistência na necessidade de repensar o socialismo situam-no no miolo das preocupações de quem defendem que a liberdade que aparece como quinta-essência do liberalismo e a igualdade que se apresenta como o propósito fundamental dos socialistas só podem existir de maneira efetiva se logram realizar-se conjunta e simultaneamente.

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Habermas, que comparte este suposto, parte na sua análise do descalabro da experiência comunista, sobre a que tem umha opiniom matizada, por quanto, se por umha parte condena severamente o totalitarismo, por outra teme e lamenta que com o fim do comunismo desapareçam as exigências sociais introduzidas para equilibrar o dogma produtivista, o primado absoluto da economia e o reino da desigualdade, características do capitalismo contemporâneo que o socialismo aceitou tal qual e com as que declarou que é necessário conviver.

Por outra parte, os socialistas ao recibir da sua própia tradiçom e dos comunistas umha herdança na que o trabalho é o único valor capaz de organizar a sociedade e o povo é o referente central e o portador capital da soberania popular, confirmam e radicalizam as servidumes a que conducem as características descritas. Por isso frente a elas, ao igual que frente ao mitificado coletivo de trabalhadores associados, do que se trata é de estabelecer umha comunidade pública de cidadãos capaz de dar resposta cabal ao maior número de demandas de cada um deles. Fronte aos macrosujeitos, como o povo e a classe social, cuja soa virtualidade hermenêutica reside na sua abstracçom e generalidade e cuja exclusiva utilidade é como arma do combate político, trata-se de voltar, escreve Habermas como nos predicava Husserl, às cousas mesmas, de atopar na intersubjectividade assumida dos actores e das suas práticas no cimento real da nossa vida em comum, o que equivale no âmbito político a apoiar-se no conjunto de interações, sobre todo comunicativas, que povoam o espaço da deliberaçom pública e constituem a trama última da democracia. Além dos imperativos da sociedade do trabalho e da ética puritana que lhe confere validez máxima, Habermas invita-nos a privilegiar o mundo da comunicaçom humana e da interaçom cidadã, a substituir o ethos do trabalho póla ética do diálogo como já adiantara Guido Calogero.

A temática do tempo cobra assi especial relevo como nom-trabalho ou tempo de lezer, como o espaço por excelência da realizaçom persoal que à sua vez exige que todos os indivíduos disponham de umha renda mínima garantida que se lhes concede nom em quanto trabalhadores mais em quanto cidadãos. Habermas nom desenvolveu especialmente esta problemática mais si que o fixêrom os habermasianos, e em particular J.M. Ferry, quem propuxo umha asignaçom dinerária anual, universal e permanente, que libere da obriga de ser convencionalmente rentáveis e permita ajudar aos demais em campos específicos da solidariedade como o ensino, a saúde, a infância, os anciãos, etc., atividades que Ferry qualifica com André Gortz como contribuiçom social.

Este último avaliava em 20.000 horas o volume da prestaçom que cada indivíduo deverá prover como contrapartida da citada asignaçom. Dado que a complexidade econômica da sociedade contemporânea e a nossa escassa capacidade inventiva nos obriga a continuar com o mercado é fundamental, por umha banda, vedar-lhe a sociedade e confiná-lo na economia e por outra fazer do Estado social e ecológico de direito o seu imperativo acompanhante. Um Estado que encarne e realize um novo Welfare State e que além da burocratizaçom e dos corporativismos restabeleça a igualdade entre os que tenhem um trabalho e os que sem el só tenhem a exclusiom como destino. Um Estado que dê a luz umha socialdemocracia na que se ponha fim à prática do privilégio e se universalizem os interesses mediante o diálogo e o consenso. O que produzirá umha verdadeira democracia na que o exercício da liberdade de cada qual contribuirá a que todos vejam satisfeitas o maior número possível das suas necessidades e preferências; é dizer, a sua efetiva igualdade.

Este é hoje o único contido desejável do único socialismo possível, o liberal. Utópico? Nom hai programa mais mobilizador que o dumha boa utopia. Sobre todo se é necessária.

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