sexta-feira, 6 de junho de 2008

José Vidal-Beneyto: O Socialismo Liberal / 1


Imos começar polo princípio, e ponher os artigos de Vidal-Beneyto sobre o socialismo liberal desde o primeiro (no anterior post vimos o nº 3). Neste que vai a seguir, o autor perfila a idea a partir das aportações de socialistas italianos como Carlo Roselli ou Guido Calogero (na foto da direita).

No século XX a luita contra os totalitarismos nazifascistas e o desafio que representam o marxismo e o comunismo polarizam a vitalidade ideológica derivada do antagonismo político que mantiveram o liberalismo e o socialismo durante o XIX, atenuando consideravelmente o perfil diferencial de ambos e a sua capacidade criadora. A isso somam-se por umha parte o parlamentarismo no qual os socialistas concentram sua acçom e, por outra, o primado da economia em todos os enfoques liberais que conferem ao econômico tratamento preferente quando nom exclusivo, o que ao evacuar, de algumha maneira, o confronto diretamente político, contribui para a sua convergência ideológica. Fica só de pé o diverso tratamento da questom religiosa, em particular na sua versom fundamentalista, cuja causa fam sua de maneira paradoxal os liberais, o que nos leva ao esperpento romano do alcalde Alemanno, que com o seu sogro Rauti mantivérom em Itália durante anos o referente fascista, associado hoje ao grande capital de Forza Itália e fervorosamente benzido polo Vaticano. Este pragmatismo politiqueiro nas alianças está facilitado polo acercamento das posições doutrinais e pola atenuaçom do debate ideológico que, ao coincidir com a atonia cidadã, reduz a política às luitas polo poder nos partidos. Todo o qual gera umha interpenetraçom e disoluçom simultâneos que comportam um processo de hibridaçom que recorre a segunda metade do século XX e inaugura processos dos que os principais som o liberalismo social entre os liberais e o socialismo liberal no âmbito socialista.

Sobre ambos o centrismo político e o seu oportunismo manobreiro operárom umha apropriaçom ilegítima que só serviu para aumentar a confusom, cujo exemplo mais revelador é o New Labour de Tony Blair e a proposta da Terceira Via de Anthony Giddens que lhe serve de corpus doutrinal. O seu propósito é adequar a socialdemocracia ao capitalismo das multinacionais mediante alguns ajustes e retoques que permitam a convivência de ambos, despois que o laborismo tenha enterrado os seus ideais de igualdade e justiça social. Mas essa interpretaçom do que poda ser o socialismo liberal contradiz o enfoque e as propostas de quem abordaram com mais rigor e radicalidade a sua problemática. Reduzindo-nos ao essencial, do que se trata é de fazer conviver liberdade e igualdade, que som os grandes pólos, os referentes centrais à par que modelos que nos propõem ambas correntes.

Nos anos 20/30 do século passado, Carlo Rosselli, militante antifascista formado nos ideais do Risorgimento, voluntário na guerra civil espanhola e assassinado em Paris com seu irmão Nello pola sinistra banda fascista La Cagoule, nos seus dous livros de 1924 e 1930 sobre Socialismo liberal, fai a primeira e mais acabada apresentaçom desta nova corrente. Para el, o liberalismo político, que nada tem a ver com o econômico ao que qualifica de "liberismo", só é inteligível como umha filosofia da liberdade que fai da autonomia do indivíduo ao mesmo tempo a sua arma de combate e o seu objetivo final. Frente ao mercado que é um simple instrumento técnico e ao Estado cuja funçom se limita a ser um órgão de polícia e de defensa, o ator principal do socialismo liberal é o mundo do trabalho ao que corresponde fazer efetiva a liberdade de todos e nom só dos ricos. Para Giustizia e Libertà, o movimento que funda durante o seu exílio parisino, é preciso acabar com os monopólios de feito e com a concentraçom da riqueza numhas poucas mãos nom recorrendo à nacionalizaçom operada por um poder público centralizado e burocrático, mas mediante a socializaçom realizada por organismos autônomos administrados por trabalhadores, técnicos e consumidores. Como insistirá 15 anos despois Guido Calogero, só umha socializaçom deste tipo permitirá democratizar as empresas, tanto públicas como privadas, colocando-as em mãos de que têm a ver com elas e impedindo que se transformem, sobretodo na sua versom última de grandes multinacionais, em patrões-ditadores das nossas vidas. A dimensom federalista, proposta em especial a nível europeu, que recolhe e empurra Altiero Spinelli, fecha o seu quadro programático. Três pensadores maiores do social, Bobbio, Lefort e Habermas, retomarám esta tentativa de interfundir liberdade e igualdade e de pensar o cumprimento do indivíduo em e pola sua realizaçom social.

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