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Artigo de Paul Krugman para o New York Times.
Os mercados financeiros estám a celebrar o acordo que emergiu de Bruxelas no início da manhã da última quinta-feira [27 de Outubro]. Realmente, tendo em conta o que poderia ter acontecido – um amargo fracasso para concordar em nada – que os líderes europeus tenham concordado em algo, por mais vagos que sejam os detalhes e por mais deficiente que o acordo poda resultar, é um avanço positivo.
Mas vale a pena examinar o quadro mais amplo, ou seja, o fracasso retumbante de umha doutrina econômica – umha doutrina que provocou danos enormes tanto à Europa como aos Estados Unidos.
A doutrina à que me refiro consiste na afirmaçom de que, após umha crise financeira, os bancos precisam ser resgatados, mas é a povoaçom em geral a que tem que pagar o preço. Assi, a crise provocada pola desregulaçom transforma-se num motivo para que haja um deslocamento ainda maior para a direita; um período de desemprego massivo, em vez de estimular a adoçom de medidas governamentais para criar empregos, transforma-se numha era de austeridade, na qual os gastos governamentais e os programas sociais som recortados drasticamente.
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Essa doutrina foi defendida com alegações de que nom havia outra alternativa – que tanto os resgates financeiros como os cortes de gastos eram necessários para satisfazer os mercados financeiros – e com a afirmaçom de que a austeridade fiscal na verdade criaria empregos. A ideia era que os cortes de gastos fariam que os consumidores e os empresários se sentissem mais confiados. E essa confiança supostamente estimularia gastos privados, o que compensaria de sobra os efeitos depressivos dos cortes governamentais.
Alguns economistas nom estavam convencidos. Um escéptico afirmava causticamente que as declarações sobre os efeitos expansivos da austeridade eram como acreditar na “fada da confiança”. O.K., vale, esse crítico era eu.
Mas, apesar disso, essa doutrina tem sido extremamente influente. A austeridade expansiva, em particular, tem sido defendida tanto polos republicanos do congresso dos Estados Unidos quanto polo Banco Central Europeu, que no ano passado rogou aos governos europeus – e nom só àqueles que enfrentavam problemas fiscais – que implementassem uma “consolidaçom fiscal”.
E, no ano passado, quando David Cameron chegou a primeiro-ministro do Reino Unido, instituiu imediatamente um programa de cortes de gastos, acreditando que isso na verdade estimularia a economia – uma decisom que foi recebida com elogios afetuosos por vários especialistas dos Estados Unidos.
Agora, porém, os resultados som visíveis, e o quadro nom é nada bonito. A Grécia foi empurrada pelas suas medidas de austeridade para um buraco econômico cada vez mais profundo – e esse buraco, e nom a falta de esforços por parte do governo grego, foi o motivo polo qual um relatório secreto enviado a líderes europeus concluiu na semana passada que o programa atualmente aplicado na Grécia é inviável. A economia britânica estancou-se polo impacto da austeridade, e a confiança de empresários e consumidores afundiu-se em lugar de disparar-se.
Talvez o feito mais revelador seja aquilo que atualmente é apresentando como umha história de êxito. Alguns meses atrás, vários analistas passaram a elogiar as façanhas da Letônia, que, após uma recessom terrível, conseguiu, nom obstante, reduzir o seu déficit orçamentário e convencer os mercados de que o país contava com bons fundamentos fiscais. O caso da Letônia foi, de feito, impressionante, mas o custo foi um índice de desemprego de 16% e umha economia que, ainda que esteja finalmente crescendo, ainda é um 18% menor do que era antes da crise.
Por isso, resgatar os bancos mentres se castiga aos trabalhadores nom constitui na verdade umha receita para prosperidade. Mas havia algumha alternativa? Bem, é por isso que eu estou na Islândia, participando numha conferência sobre o país que fixo algo diferente.
Aqueles que tenhem lido notícias sobre a crise financeira, ou assistido a filmes como o excelente “Inside Job”, sabem que a Islândia deveria ser considerada a suprema história de desastre econômico: os seus banqueiros descontrolados sobrecarregaram o país com dívidas enormes e aparentemente deixaram a naçom numha situaçom irremediável.
Mas algo curioso aconteceu no caminho ao apocalipse financeiro: o próprio desespero da Islândia fixo que um comportamento convencional se tornasse impossível, o que lhe deu ao país liberdade para romper com as regras. Quando todo o mundo resgatou os bancos e obrigou à cidadania a pagar o preço, a Islândia deixou os bancos quebrarem e, de feito, ampliou a sua rede de segurança social. Quando todos os demais estavam obsessionados com acalmar os investidores internacionais, a Islândia impuxo controis temporários aos movimentos de capital a fim de obter espaço de manobra.
E como lhe está indo ao país? A Islândia nom evitou um grande dano econômico nem um descenso significativo do nível de vida. Mas conseguiu limitar tanto o aumento do desemprego como o sofrimento da parcela mais vulnerável da povoaçom; a rede de segurança social sobreviveu intacta, assi como a decência básica da sua sociedade. “As cousas poderiam ter sido bem piores” pode nom ser o mais animador dos slogans, mas quando todo mundo esperava um desastre total, a frase equivale a um triunfo de política econômica.
E hai nisso umha liçom para todos nós: o sofrimento polo que tantos dos nossos cidadãos estám a passar é desnecessário. Se esta época se caracteriza por um sofrimento incrível e um endurecimento da nossa sociedade, foi por eleiçom. Nom tinha, nem tem, por que ser assi.
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