domingo, 20 de abril de 2008

A polémica dos agrocombustíveis (II)


Resposta de Lula às críticas da ONU aos agrocombustíveis:

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva chamou ontem de "palpiteiros" e "simplistas" os críticos do álcool e dos biocombustíveis

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva chamou ontem de "palpiteiros" e "simplistas" os críticos do álcool e dos biocombustíveis. Ao minimizar alertas das Nações Unidas sobre a produção de alimentos, disse que "o verdadeiro crime contra a humanidade" será descartar "a priori" as fontes alternativas de energia.

Lula também atacou o protecionismo dos países industrializados e questionou a forma de atuação do FMI (Fundo Monetário Nacional).

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Concedidas em entrevista e reforçadas em discurso na abertura de Conferência da FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação) em Brasília, as declarações foram interpretadas como uma resposta de Lula ao relator especial das Nações Unidas para o Direito à Alimentação, o suíço Jean Ziegler.

Na segunda-feira, ele chamou de "crime contra a humanidade" a expansão dos biocombustíveis e pediu uma moratória desses projetos para evitar desabastecimento de produtos alimentícios em vários países.

No discurso, Lula rebateu: "É sempre mais fácil escolher respostas simplistas, esconder interesses econômicos e agendas políticas por trás de supostas preocupações sociais e ambientais". Antes, em entrevista, ele já havia dito que "é muito fácil alguém ficar sentado em um banco da Suíça dando palpite no Brasil ou na África".

"É importante vir aqui e meter o pé no barro para saber como é que a gente vive, para saber a quantidade de terras que nós temos e para saber a quantidade e o potencial de produção que nós temos", disse o presidente.

O petista tentou descolar a influência de biocombustíveis na produção de comida e listou seis explicações que, segundo ele, respondem pelo recente aumento global dos preços dos alimentos. São eles: a alta dos preços do petróleo, a queda na safra de vários países causada por fenômenos climáticos diversos, o aumento de preço dos fretes, as mudanças cambiais, a especulação nos mercados financeiros e a alta no consumo de alimentos em países em desenvolvimento, como China, Índia e Brasil.

Protagonistas

Tentando ocupar o posto de porta-voz dos países emergentes, Lula disse que os países mais pobres não podem ser "meros coadjuvantes" e devem aproveitar a escassez para negociar aberturas de mercados e redução de subsídios nos Estados Unidos e na Europa.

"A incapacidade de muitos países de produzir seus próprios alimentos se deve a décadas e por vezes séculos de distorções no comércio internacional de produtos agrícolas. Pesa o protecionismo. Pesam os subsídios da agricultura dos ricos, que tiram condições de competitividade do pequeno agricultor. Essas distorções criaram dependência, quando não o desmantelamento de estruturas produtivas inteiras", afirmou Lula.

O presidente voltou a defender a conclusão da rodada Doha de negociações comerciais e disse que, se não houver abertura do mercado agrícola europeu para os produtos agrícolas dos países pobres, o acordo será muito difícil. "E alguém vai ter de assumir a responsabilidade histórica", afirmou.

Visivelmente irritado, Lula chegou a ironizar o comportamento do FMI em seu discurso ao defender que os países pobres façam valer a sua lógica. "Na década de 80 e 90, cada delegado que está aqui deve ter visto no seu país descer uma delegação do FMI para dizer que tinha de fazer ajuste fiscal, tinha que cuidar dos juros, diminuir o Estado, porque senão estaria quebrado. É engraçado que eu não vi o FMI dar uma única opinião sobre a crise americana, uma única opinião. Ou seja, até quando nós vamos aceitar o papel de coadjuvantes do cenário internacional? Até quando?", questionou.



Postura da Conferência Especial para a Soberania Alimentar:

Movimentos sociais condenam biocombustíveis

Pouco antes de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva proferir um duro discurso rebatendo as críticas dos países desenvolvidos aos biocombustíveis, na 30ª Conferência Regional da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) para América Latina e Caribe, hoje, foi distribuído à imprensa documento redigido por representantes dos movimentos sociais, em reunião prévia, condenando o uso de terras para a produção de combustíveis.

"Os representantes (dos movimentos sociais) expressam seu mais enérgico rechaço à geração, desenvolvimento e uso de agrocombustíveis e toda a geração de energia através da biomassa", diz a declaração final da Conferência Especial para a Soberania Alimentar, realizada em Brasília entre os dias 10 e 13 de abril. O encontro reuniu 120 organizações sociais representativas de pequenos agricultores, pescadores e índios, de 20 países da América Latina e Caribe, para aprovar recomendações à conferência da FAO.

"Fazemos nosso o chamado urgente do relator das Nações Unidas para o Direito à Alimentação, Jean Ziegler, para que os governos declarem uma moratória internacional sobre todos os incentivos para a produção e o comércio dos agrocombustíveis", diz o documento, referindo-se à declaração dada pelo suíço Jean Ziegler, no último dia 5, segundo a qual o uso de terras agricultáveis para a produção de biocombustíveis é um "crime contra a humanidade".

A afirmação de Ziegler irritou integrantes do governo brasileiro. Lula declarou hoje que "é fácil sentar num banco na Suíça e ficar dando palpite." O porta-voz da conferência dos movimentos sociais, o chileno Mario Almada, explicou que a moratória defendida no documento significa suspender qualquer forma de incentivo para a produção de biocombustíveis.

A condenação, disse ele, se aplica "especialmente" à produção do biodiesel com matérias-primas produzidas pela agricultura familiar. "O pequeno agricultor não pode se transformar num monocultor", afirmou ele. "O presidente Lula está equivocado se acha que vai gerar desenvolvimento dessa maneira."

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